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Matheus Pichonelli

De global a ex-bolsonarista: Alexandre Frota é o Forrest Gump nacional

Matheus Pichonelli

15/08/2019 04h00

Alexandre Frota (à dir.) em cena de "Sassaricando" com Rômulo Arantes (Foto: Nelson di Rago/TV Globo)

 

É bom prestar atenção para onde vai o deputado Alexandre Frota do PSL após criticar o filho do presidente Jair Bolsonaro e ser expulso do PSL. Poucos no país têm o olfato mais apurado que ele para sentir o vento das oportunidades surgidas no Brasil das últimas três décadas. E poucos incorporaram como ele as metamorfoses estéticas de todo um país.

Uma galeria de fotos da carreira do ator, político e pensador, publicada na quarta-feira (14/8) pelo jornal "O Globo", mostra que ele é uma espécie de Forrest Gump da história nacional.

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Foi por falta de idade, e não de oportunidade, que ele não foi flagrado na Revolução de 1932, primeiro com os paulistas, depois com os soldados vitoriosos; ou nos protestos em defesa da família, em 1964, e depois nos das Diretas, quando a democracia voltou à moda.

Naqueles anos 1980, política ainda era assunto para profissionais, e Frota, camisa do Mengão embaixo do macacão, vivia o auge da fama como o global que namorava a Tancinha (Claudia Raia) em "Sassaricando", novela que chegou a bater 60 pontos no Ibope. Na vida real, eles eram uma espécie de casal 20. O anúncio do casamento aconteceu ao vivo, no programa do Chacrinha. A união foi mais efêmera do que qualquer plano econômico do governo Sarney e durou até 1989.

Frota seguiu fazendo novela na Globo. Foi Raúl, Jaú, Boca, Pavão e Robson, este último papel em "Malhação", febre da garotada no fim dos anos 90. Ele também foi Rico, na novela "Olho Por Olho", em sua curta passagem pela TV Manchete dez anos antes de a emissora falir.

No começo dos anos 2000, já sentindo a onda da nova década, ele participou da "Casa dos Artistas", o primeiro reality show da TV brasileira. Você pode não lembrar, mas poucas imagens falavam tanto sobre as referências estéticas daquele tempo do que Supla e Alexandre Frota no mesmo quadro.

Antecipando a diáspora brasileira a Portugal, ele também gravou um programa similar na antiga metrópole, onde fez vários stripteases e, a exemplo de Vampeta e Dinei, craques da época, preparou terreno para posar nu na G Magazine, um dos maiores cases de sucesso editorial da época.

O funk carioca começava a fazer sucesso. Era a década do Bonde do Tigrão, Cerol na Mão, Eguinha Pocotó e nosso Forrest Gump não podia ficar de fora: virou empresário e apresentador de programas de funk, no qual aparecia com o figurino da época: regata preta da Bad Boy, boné e tatuagem nos ombros que cresciam em proporção geométrica. Era o auge da estética Johnny Bravo, recentemente redescoberto por Bolsonaro.

Foi mais ou menos nessa época que ele decidiu trabalhar com a produtora Brasileirinhas, promissora empresa de filmes pornô made in Brasil. Poucos nomes dizem tanto sobre o início dos anos 2000 do que esse, mas logo vieram a pirataria, a internet e era melhor abraçar outras tendências.

Ele tentou a vida como jogador de futebol americano, modalidade que começava a fazer sucesso por aqui, atuou como produtor da "Praça É Nossa", foi demitido em 2012 e, na encruzilhada da vida, como um país inteiro, um ano depois, decidiu decifrar qual era o recado das ruas durante os protestos de 2013.

Foi mais ou menos nessa época que a política começava a substituir a novela como tema favorito nos almoços de domingo, e Frota, em sua fase paneleira/tuiteira, logo se tornou símbolo das manifestações pelo impeachment, depois de defender movimentos como o Escola sem Partido (hoje fora de moda).

Faltava só incorporar a faceta religiosa/moralista para, como muitos parceiros de rua, atravessar o rubicão dos protestos políticos em direção à política de fato. A máscara bolsonarista caiu como uma luva na onda que elegeu presidente o capitão, que, em sete meses de mandato, começa a se queimar com parte do eleitorado propondo racionamento da atividade intestinal ou presenteando o filho com uma embaixada nos EUA.

Sem boné, mas com terno e gravata, óculos de intelectual e a barba alinhada de quem passou pela barbearia antes de trabalhar, Alexandre Frota agora interpreta o personagem do deputado dedicado, disposto a aprovar as reformas e que demonstra ponderação diante das excrescências do presidente que ajudou a eleger.

Quer saber para onde vai o Brasil daqui a alguns anos? Observe para onde vai o nosso Forrest Gump. Se não estiver o futuro presidente, neste barco certamente estará ao menos a tendência do verão 2020. Run, Frota, Run!

Sobre o autor

Matheus Pichonelli é jornalista reincidente e cientista social não praticante. Trabalhou em veículos como Folha de S.Paulo, portal iG, Gazeta Esportiva, Yahoo e Carta Capital. Araraquarense, desistiu de São Paulo após 12 anos e voltou a morar no interior, de onde escreve sobre comportamento, cinema, política e (às vezes) futebol.

Sobre o blog

Este blog é um espaço de compartilhamento de dúvidas, angústias e ansiedades vivenciadas em um mundo cada vez mais conectado, veloz e impessoal.