Com Caetano e Frota, CPI das Fake News tem elenco mais quente que A Fazenda
Matheus Pichonelli
31/10/2019 04h00
O deputado Alexandre Frota (PSDB-SP) durante depoimento à CPI das Fake News
São mais de 150 convidados, entre eles o youtuber Felipe Neto, o cantor Caetano Veloso, as atrizes Taís Araújo e Carolina Dieckmann, os deputados Alexandre Frota (PSDB-SP) e Joice Hasselmann (PSL-SP) e a ministra Damares Alves.
Diferentemente de um reality show clássico, os participantes não precisarão ser confinados para demonstrar tudo o que sabem sobre a ardilosidade, os conchavos, os ciúmes, as traições e os golpes baixos que compõem a condição humana. Convidados, e não convocados, a maioria deles poderá aceitar ou não o requerimento, e mal deve se encontrar nos corredores do Congresso.
Ainda assim, a temporada da CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito) das Fake News promete. Será um novo flanco de tensão para Jair Bolsonaro, que dias antes declarou guerra à imprensa ao ser citado no caso Marielle Franco em uma história pra lá de estranha e viu surgiu novos áudios do encrencado ex-assessor Fabrício Queiroz.
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A vereadora assassinada, aliás, é ainda hoje um dos principais alvos das redes de mentira publicadas aos montes na esgotosfera. As primeiras montagens, que atribuíam a ela uma falsa ligação com traficantes, não esperaram sequer o velório. Foram compartilhadas por desafetos e autoridades que deveriam ter algum discernimento antes de proferir sentenças nas redes, caso da desembargadora Marília Castro Neves.
Alexandre Frota, que já participou de A Fazenda, foi a primeira celebridade a falar à comissão nesta quarta (30). Em pé de guerra com os ex-aliados do governo, ele já chamou de "jogo sujo" a campanha que ajudou a eleger Jair Bolsonaro por meio de notícias falsas.
Em sua estreia, ele acusou o governo de patrocinar um esquema de terrorismo virtual comandado por "ratos da web", que atuam de "maneira perversa" intimidando opositores em redes sociais e grupos de WhatsApp. "São assessores credenciados que saíram do esgoto", declarou.
Frota ironizou o fato de que, após a vitória nas urnas, "os bolsonaristas pararam de falar sobre mamadeira de piroca".
Em um dos muitos bate-bocas, ouviu do deputado e desafeto Eduardo Bolsonaro (PSL-SP) que ele era menos promíscuo quando fazia filme pornô. "Bem que você assistia", respondeu.
A sessão foi tumultuada e interrompida diversas vezes. O presidente da comissão, Angelo Coronel (PSD-BA), chegou a pedir ajuda aos seguranças do Congresso.
O ator-deputado disse que os linchamentos virtuais são orientados pelo filósofo Olavo de Carvalho, que chamou de "charlatão" e foi comparado a Herculano Quintanilha, personagem de Rodrigo Lombardi na novela O Astro.
O ponto alto do depoimento foi quando ele mostrou um tuíte, impresso em papel, em que o perfil @OlavoDeCarvalho prometia lamber Caetano Veloso em partes impublicáveis se Bolsonaro fosse algum dia envolvido em algum escândalo. "Um cara que indica ministro, que trabalha em cima de ministro, ele e a milícia dele fazem isso. Espero que o Caetano tome cuidado".
Detalhe: o perfil citado era fake.
Frota foi um dos autores de ofensas contra Caetano Veloso após o compositor se manifestar a favor da liberdade artística em exposições como a "Queermuseu", em 2017. Convidado a depor na CPI, ele também foi atacado por membros do Movimento Brasil Livre (MBL). Todos foram processados.
De férias com Joice
Outro depoimento aguardado é o de Joice Hasselmann. A exemplo de Frota, ela tem tudo para transformar a comissão em uma versão candanga do reality De Férias com o Ex, revelando tudo o que sabe das traquinagens feitas no verão passado pela família presidencial, conforme já adiantou nas redes.
Diante dos microfones, não poderá se comunicar com os emojis usados como arma na guerra contra os herdeiros do presidente.
Quem também pode ser convocado é o vereador do Rio Carlos Bolsonaro, responsável pelas redes sociais do pai. Auxiliares do presidente suspeitos de integrarem o chamado "gabinete do ódio", como o assessor especial Felipe Martins, já estão na lista de convocados.
A presença de Anitta na CPI das Fake News, por sua vez, era Fake News.
Os trabalhos foram iniciados oficialmente na última terça-feira, dia 29. Apesar do elenco eclético, que em si dará uma pegada pop às sessões, o assunto é bem sério.
Felipe Neto, por exemplo, poderá falar sobre os ataques sofridos após se opor à censura do prefeito do Rio, Marcelo Crivella, a um livro da Bienal do Livro que continha um beijo gay. E Taís Araújo deve falar sobre manifestações racistas sofridas na rede.
Composta por 15 deputados e 15 senadores, a comissão mista pretende investigar a criação de perfis falsos e ataques cibernéticos em redes sociais e seus possíveis desdobramentos nas últimas eleições, além do cyberbullying contra autoridades e cidadãos vulneráveis e o aliciamento de crianças para crimes de ódio e incitação ao suicídio.
Os próximos episódios prometem.
Sobre o autor
Matheus Pichonelli é jornalista reincidente e cientista social não praticante. Trabalhou em veículos como Folha de S.Paulo, portal iG, Gazeta Esportiva, Yahoo e Carta Capital. Araraquarense, desistiu de São Paulo após 12 anos e voltou a morar no interior, de onde escreve sobre comportamento, cinema, política e (às vezes) futebol.
Sobre o blog
Este blog é um espaço de compartilhamento de dúvidas, angústias e ansiedades vivenciadas em um mundo cada vez mais conectado, veloz e impessoal.